quarta-feira, 20 de abril de 2016

Marte, nos aguarde!



A NASA está testando equipamentos de detecção de vida alienígena no Atacama


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29 February 2016 // 09:40 PM CET




Com seu clima seco e altitude elevada, o deserto do Atacama, no Chile, é um dos melhores locais da Terra para observar as estrelas. Não à toa, a região abrigará, em breve, o maior telescópio do mundo. O equipamento, dizem os cientistas, será capaz de detectar sinais de vida na atmosfera de outros planetas.

Mas não é apenas o céu do Atacama que revolucionará a busca por vida extraterrestre — o solo da região também. Conhecido como o lugar mais seco do mundo e alvo de níveis incríveis de radiação ultravioleta, o deserto é o mais próximo que podemos chegar de Marte sem de fato ir até o Planeta Vermelho.

Por esse motivo, a NASA tem organizado expedições ao deserto a fim de testar os novos instrumentos de detecção de vida que serão utilizados nas futuras missões em Marte. O último desses projetos — o Atacama Rover Astrobiology Drilling Studies (mais conhecido como ARADS) — acabou de encerrar sua primeira missão na Estação de Yungay, onde as condições climáticas são muito semelhantes as de Marte.

Para compreender as particularidades do equipamento de detecção de vida da NASA, a equipe ARADS passou um mês desbravando a região seca e inóspita. Durante a estadia, pesquisadores fizeram testes com um protótipo de broca semelhante ao que será usado em Marte,um Detector de Sinais de Vida (SOLID, na sigla original) criado na Espanha e um modelo do Laboratório de Química Líquida (WCL) incluso na sonda Phoenix, que pousou na superfície de Marte em 2008.



Pesquisadores da equipe ARADS examinam amostras do solo retiradas de uma escavação científica de 2m². Crédito: NASA

“Testar equipamentos de detecção de vida em um ambiente análogo a Marte nos ajudará a pensar em novas formas de detectar a existência, atual ou passada, de vida em Marte", disse Brian Glass, pesquisador-chefe do projeto ARADS, em um comunicado oficial da NASA.

“O acesso ao subsolo e a otimização da mobilidade na superfície irão aumentar o número de biomarcadores e de áreas analisados no Atacama".

Durante a viagem, a equipe analisou três áreas: Yungay, Salar Grande e Maria Elena. A região de Yungay tem sido foco de estudos astrobiológicos há mais de uma década graças às suas condições incrivelmente hostis. Em 2003, pesquisadores utilizaram os mesmos detectores de vida acoplados às sondas VIKING, lançadas em 1975, e descobriram a mesma quantidade de material biológico encontrado pelos detectores originais no solo marciano — zero. Considerando que mesmo as regiões mais inóspitas da Antártica possuem micróbios extremófilos, a esterilidade total de Yungay faz dessa região uma área importantíssima para a astrobiologia.

Salar Grande, por sua vez, é uma planície de sal reluzente, enquanto Maria Elena, a terceira região estudada, é ainda mais seca e inóspita que Yungay. Está claro que a equipe ARADS possui ao seu dispor uma série de locais extraordinários para testar seus equipamentos caça-marcianos.

Os pesquisadores visitarão o Atacama ao longo dos próximos quatro anos para testar brocas, kits de detecção e sondas. Além disso, eles têm como objetivo aperfeiçoar o processo de localização de organismos extremófilos e o procesos de distinção entre fatores bióticos e abióticos. 

Depois, claro, as futuras versões desses equipamentos desbravarão os desertos de Marte, repetindo o trabalho dos pesquisadores aqui da Terra. Esses esforços poderão resultar na primeira evidência de vida fora de nosso planeta. 

Caso isso não aconteça, podemos apostar nos astrônomos do Atacama: com ajuda dos super-telescópios instalados no deserto, esses cientistas podem descobrir evidências concretas da existência de vida em planetas distantes.

Se isso irá de fato acontecer, só o tempo dirá. No entanto, não podemos negar que esse deserto chileno está se revelando uma peça essencial na busca por vida extraterrestre.
Tradução: Ananda Pieratti

quinta-feira, 14 de abril de 2016

Ebah!




A próxima cúpula da ONU pode finalmente acabar com a guerra às drogas
Por Stuart Rodger
abril 14, 2016









 Foto: David Hudson.


Mês que vem, os 193 países-membros das Nações Unidas vão se encontrar para falar sobre drogas. Da última vez que isso aconteceu, em 1998, a cúpula terminou com uma ambição bastante utópica: a total erradicação de todas as drogas no mundo inteiro. "Um mundo sem drogas — podemos fazer isso!", declarou a cúpula. Dezoito anos depois, os narcóticos continuam populares como sempre, com a ONU estimando que o número de usuários de drogas ilícitas no mundo vai crescer 25% até 2050. 

Enquanto isso, alguns países vêm experimentando abordagens alternativas. Portugal descriminalizou todas as drogas em 2001, a Suíça foi a pioneira em distribuir prescrições de heroína, e os estados norte-americanos de Washington e Colorado legalizaram a venda de maconha para uso recreativo. Até agora, todos esses esquemas se mostraram, no geral, um sucesso em minimizar danos e impulsionar a economia local

Na Sessão Especial da Assembleia Geral da ONU (UNGASS em inglês), que começa no dia 19 de abril, várias ONGs e grupos ativistas vão fazer lobby sobre os méritos das alternativas à proibição. Falei com Steve Rolles, ativista de longa data do grupo britânico Transform, que luta por políticas justas de drogas, sobre por que essa cúpula é tão importante.
 

 Foto: Chris Bethell.

VICE: Oi, Steve. Por que essa cúpula importa?

Steve Rolles: A UNGASS foi pedida pela Colômbia, México e Guatemala. Nesses países, a "guerra às drogas" não é só retórica — ela acontece com grandes custos humanos, e eles já estão cansados disso. Esses países chamaram a cúpula com uma reforma específica em mente: considerar os fracassos da guerra às drogas e "conduzir a uma análise profunda de todas as opções disponíveis, incluindo medidas regulatórias ou de mercado" — o que quer dizer legalização.

É a primeira vez que os líderes mundiais vão se reunir para discutir a questão das drogas nessas bases, e a primeira reunião do tipo desde que países como o Uruguai e EUA começaram a legalizar a maconha. 

Em alguns países, pessoas ainda são executadas por fazer o que é completamente legal em vários outros. Está claro que o modelo proibitivo e punitivo fracassou; a UNGASS é um momento crítico para o mundo considerar outras maneiras de seguir em frente, de tentar políticas que possam alcançar a realidade. 

A ONU se mostrava muito entusiasmada com a guerra às drogas no passado. Você acha que isso será um problema aqui?

É difícil falar sobre a ONU como uma entidade única. As agências de drogas da ONU são muito conservadoras e se opõem a qualquer mudança na guerra às drogas que supervisionam há 50 anos. Porque é isso que elas fazem, basicamente supervisionam uma guerra às drogas — com milhares de mortes por ano — dentro de uma organização, que deveria principalmente prevenir guerras. Os abusos de direitos humanos, os conflitos, as doenças e as mortes que resultam dessa guerra são exatamente o problema que a ONU deveria estar prevenindo.

Mas as agências de combate às drogas estão cada vez mais isoladas dentro do sistema da própria ONU. Um dos pontos positivos da UNGASS tem sido o primeiro envolvimento real das agências da ONU no debate das drogas. Relatórios da agência de direitos humanos, a UNAIDS, e do programa de desenvolvimento da ONU, entregaram críticas devastadoras à guerra às drogas. Todos esses grupos pedem a descriminalização. Então há uma luta acontecendo dentro da ONU — não é apenas entre os países-membros que não há consenso. 

 Foto por Michael Segalov.

Todo mundo concorda que a proibição tem sido um desastre. Mas qual é o aspecto mais contraprodutivo disso?

Depois de 50 anos e literalmente trilhões de dólares gastos nisso, mais gente do que nunca usa drogas, e as drogas estão mais baratas e fáceis de achar — então a guerra falhou em seus próprios termos. O que ela conseguiu foi abastecer uma grande violência no comércio ilícito, criando caos e miséria no mundo todo. A resposta policial, por sua vez, licenciou abusos horríveis, encarceramento em massa e colocou o fardo da ficha criminal sobre milhões de pessoas. Ela tornou as drogas mais arriscadas, criou obstáculos para o tratamento e redução de danos, e abasteceu uma epidemia de HIV e hepatite C entre os usuários de drogas injetáveis. Esse é um dos maiores desastres de política social do último século. O Alternative World Drug Report que publicamos conta essa história em todos os seus detalhes sórdidos.

Que alternativas serão defendidas na cúpula?

Há várias agendas reformistas em jogo. No geral, a ideia é se afastar da abordagem de punição e proibição para algo baseado nos três pilares da ONU — paz, direitos humanos e desenvolvimento — com saúde pública obviamente enlaçada a todos eles. Em termos mais específicos, há muita pressão para acabar com a criminalização de usuários de drogas — algo que tem um apoio quase universal das ONGs, muitos dos estados-membros e todas as agências da ONU, assim como do próprio Ban Ki Moon.

Há grandes esperanças de comprometimento para melhorar a redução de danos, deter o avanço da epidemia de HIV e abolir a pena de morte para tráfico. Muitos estão pressionando para que o sistema de controle de drogas global seja reformado, para que os países que quiserem legalizar a maconha possam fazê-lo, mas essa mudança ainda enfrenta muita resistência da velha guarda. Só que cada vez mais países estão fazendo a legalização mesmo assim, então alguém vai ter que ceder. Pode não ser nessa cúpula, mas será logo, ou o sistema vai implodir sob as próprias contradições. 

Você defende essa questão há muito tempo. Como você viu o movimento antiguerra às drogas evoluir?

A cúpula vem sendo um grande foco para o movimento global. Redes se expandiram e se consolidaram, novos públicos e grupos de interesse foram trazidos a bordo. É difícil por causa da variedade de questões em jogo e da natureza do assunto, mas campanhas como stoptheharm.com, Support. Don't Punish, a campanha 10 by 20 e a Anyone's Child — que está se expandindo para se tornar uma rede global de famílias que foram impactadas negativamente pela guerra às drogas — fizeram um ótimo trabalho fornecendo um foco para nossas atividades. O ativismo vai de defesa da legalização nos altos escalões até trabalho voltado para o público. É a primeira vez em 20 anos que vejo esse nível de coordenação, união e foco. Mesmo se o resultado formal da UNGASS não for o que esperamos, o movimento está mais forte que nunca — e ganhando impulso a cada dia.

A cúpula pode ser o ponto de guinada que vai levar ao fim da guerra às drogas?

Sim, acho que ela vai sinalizar o começo do fim. Vai mostrar de uma vez por todas que o consenso sobre a guerra às drogas está irreparavelmente danificado, que muitos países não vão mais segui-la cegamente e exigirão reformas no sistema, ou simplesmente se afastarão dela. Mas temos que ser realistas — a guerra às drogas vem se arrastando há 50 anos e ela não vai acabar do dia para a noite. A reforma será um processo geracional, mas está claro que ela já começou e que está ganhando velocidade. A UNGASS será um ponto sem volta para o debate de alto nível, que vai ajudar a melhorar o espaço para que muitos países comecem a experimentar alternativas para os fracassos desastrosos da guerra às drogas.

Obrigado, Steve.
Tradução: Marina Schnoor
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sexta-feira, 8 de abril de 2016

Redes neurais



Como os computadores pretendem imitar o cérebro
Redação do Site Inovação Tecnológica -  30/04/2014





Um cérebro eletrônico espalhado pela mesa: protótipo do Neurogrid, um computador neuromórfico que o pesquisador vislumbra vender a US$400 cada um. [Imagem: Stanford University]

Pesquisadores neuromórficos
Apesar de toda a sua sofisticação, os computadores empalidecem quando são comparados com o mais simples dos cérebros.

O córtex de um camundongo, por exemplo, opera 9.000 vezes mais rápido e consome 40.000 vezes menos energia do que uma simulação de suas funções feita em computador - valores que podem aumentar conforme as técnicas de medição da atividade cerebral melhoram.

Isso, contudo, é um incentivo para os pesquisadores que trabalham na tentativa de construir os primeiros processadores neuromórficos - que operam imitando o funcionamento dos neurônios.

A última grande novidade na área surgiu há exatamente um ano, quando a equipe do Dr. Kwabena Boahen, da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, apresentou seu Neurogrid.
Do alto do seu lugar no pódio, o Dr. Boahen foi agora convidado pelo renomado IEEE (Instituto de Engenheiros Elétricos e Eletrônicos) para fazer um apanhado dos principais avanços na área, destacando os projetos mais promissores.

O artigo analisa como os "pesquisadores neuromórficos" estão usando silício e software para construir sistemas eletrônicos que imitam neurônios e sinapses, com vistas a construir uma geração de computadores mais eficientes e mais rápidos.


O objetivo do Projeto Cérebro Humano é compreender o mau funcionamento do cérebro humano, que leva a doenças como Parkinson e Alzheimer. [Imagem: Nevit Dilmen/Wikimedia]

Efervescência cerebral
Em seu artigo, Boahen observa o contexto mais amplo da investigação neuromórfica, começando pelo Projeto Cérebro Humano da União Europeia, que tem como objetivo simular um cérebro humano em um supercomputador.

Já o projeto norte-americano Brain (sigla para pesquisa do cérebro através de neurotecnologias inovadoras avançadas) adotou uma abordagem de construção de ferramentas, desafiando os cientistas a desenvolver novos tipos de mecanismos que possam ler a atividade de milhares ou mesmo milhões de neurônios no cérebro, assim como registrar padrões complexos de atividade.

Outras equipes estão se voltando para o hardware, como o projeto Synapse da IBM (sigla de sistemas de eletrônica plástica neuromórfica adaptativa e escalável).

Como o nome indica, o projeto Synapse envolve uma tentativa de redesenhar os chips - que receberam o codinome de Golden Gate - para emular a capacidade dos neurônios para fazer um grande número de conexões sinápticas, uma característica que ajuda o cérebro a resolver problemas em paralelo.

Até o momento, um chip Golden Gate é composto por 256 neurônios digitais, cada um equipado com 1.024 circuitos sinápticos, mas a IBM já está trabalhando para aumentar consideravelmente o número de neurônios em cada processador.

O projeto BrainScales, da Universidade de Heidelberg, na Alemanha, mereceu destaque na análise, com seu objetivo ambicioso de imitar o comportamento de neurônios e sinapses usando chips analógicos.
Seu chip Hicann (sigla para rede neural analógica com grande número de entradas) deverá ser o núcleo de um sistema projetado para acelerar as simulações do cérebro, permitindo aos pesquisadores modelar interações medicamentosas que podem levar meses para serem feitas no método tradicional de laboratório.

No momento, o chip Hicann consegue emular 512 neurônios, cada um equipado com 224 circuitos sinápticos, mas a equipe também já está trabalhando para aumentar esse poder neuronal.


A grande novidade do projeto Brainscale é imitar o cérebro usando um processador neuromórfico analógico. [Imagem: Pfeil et al.]

Métrica para processadores neurais
O Dr. Boahen avalia que cada uma dessas equipes tem feito escolhas técnicas diferentes, como a possibilidade de dedicar cada circuito de hardware para modelar um único elemento neural (por exemplo, uma única sinapse) ou várias (por exemplo, ativando o circuito de hardware duas vezes para modelar o efeito de duas sinapses ativas).

Estas escolhas, obviamente, resultam em diferentes ganhos e perdas em termos de capacidade e desempenho.

Para tentar avaliar qual delas tem mais vantagens, Boahen propõe uma métrica que tente dar conta do custo total do sistema, incluindo o tamanho do chip, quantos neurônios ele simula e a energia que consome.

Talvez seja melhor ouvir as outras equipes antes, mas a métrica proposta por Boahen conclui que seu próprio chip, o Neurogrid, é o mais eficiente em termos de simular neurônios.

A seu favor está o fato de que o grande objetivo é construir um sistema que seja acessível o suficiente para ser amplamente utilizado em pesquisa por qualquer grupo que queira se dedicar à área.

Boahen destaca que seu protótipo custou US$40,000, mas foi construído na universidade com uma tecnologia de microeletrônica de 15 anos atrás.

Fabricado hoje em grandes quantidades, cada computador Neurogrid completo - a placa inteira - poderia custar 100 vezes menos, o que faz o pesquisador sonhar com um milhão de computadores neuromórficos vendidos a US$400 cada um.

Neurocompilador
Antes disso, porém, será necessário projetar o software que permita programar um computador neuromórfico.

E este é um desafio ainda a ser vencido por todas as equipes, qualquer que seja a abordagem utilizada para a implementação do "cérebro de silício."

"Neste momento, você tem que saber como o cérebro funciona para programar um desses," disse Boahen. "Queremos criar um neurocompilador de modo que você não precise saber nada sobre sinapses e neurônios para poder usar um desses."
Veja outras pesquisas sobre a criação de cérebros artificiais:
Bibliografia:

Neurogrid: A Mixed-Analog-Digital Multichip System for Large-Scale Neural Simulations
B. V. Benjamin, P. Gao, E. McQuinn, S. Choudhary
Proceedings of the IEEE
Vol.: PP, Issue: 99 - Page(s): 1-18
DOI: 10.1109/JPROC.2014.2313565