Economia
criativa: a chave para ativar um futuro abundante
A Economia Criativa muitas vezes
é limitada à criatividade ou produção artística, quando na verdade representa
um universo de possibilidades de criação a partir de recursos intangíveis e
abundantes.
Alonso Neto, 4 de maio de 2016
iStock
Um conceito muitas vezes incompreendido e com
enorme potencial de transformação.
Assim é a Economia Criativa,
termo comumente associado à criatividade e à produção cultural, mas que
representa um universo infinitamente amplo de oportunidades e geração de
riquezas.
O fato é que a Economia Criativa
é muito mais do que soluções criativas e produção cultural, e este é o ponto
chave para entendê-la.
Ainda hoje o termo não é definido
de forma unânime e apresenta diferentes entendimentos ao redor do mundo, apesar
de que não há dúvidas que o cerne de seu significado pode ser compreendido como
a geração de valor a partir de recursos intangíveis como o conhecimento, a
criatividade, o capital intelectual, o talento individual e a inteligência
coletiva.
“Economia
Criativa é um processo que gera valor a partir de recursos intangíveis,
realizado por um ecossistema diverso.” Lala Deheinzelin
Ao contrário da indústria tradicional que entrega produtos e serviços acabados, a Economia Criativa é um processo que foca no potencial individual ou coletivo para produzir bens e serviços, tangíveis ou intangíveis, gerando valor para as partes envolvidas.
A ORIGEM DO TERMO
O conceito de “indústria
criativa”, origem da Economia Criativa, surgiu na Austrália em 1994 quando em
um discurso chamado “Creative Nation”, o Primeiro-Ministro australiano Paul
Keating preocupava-se em como aproveitar as oportunidades geradas pela
globalização e pelas mídias digitais como forma de potencializar a economia do
país e contribuir para o desenvolvimento da nação a partir de sua identidade
cultural, e deste pressuposto lançou um conjunto de políticas públicas baseadas
na produção cultural e artística.
“The
level of our creativity substantially determines our ability to adapt to new
economic imperatives. It is a valuable export in itself and an essential
accompaniment to the export of other commodities. It attracts tourists and
students. It is essential to our economic success.” Paul
Keating
Em 1997, a ideia de indústrias criativas ganhou força na Inglaterra quando o Primeiro-Ministro Tony Blair criou uma força-tarefa multissetorial entre governo, empresas e criadores para estudar as riquezas culturais do país e criar vantagens competitivas no cenário global. Assim, desenvolveu-se uma forte indústria cultural que abriu caminho para o desenvolvimento e envolvimento com outras áreas a partir dos valores culturais presentes na nação.
Dessa forma, Austrália e
Inglaterra foram os primeiros países a utilizarem deliberadamente o potencial
cultural e criativo de suas nações através de políticas públicas para gerarem
valor econômico, e hoje lideram as estatísticas em Economia Criativa.
“Difícil medir seu potencial
multiplicador, mas o que se percebe é que cada vez mais cresce em todo mundo
sua participação no Produto Interno Bruto (PIB) da maioria dos países. E, nesta
época de grande competitividade, a criatividade – mola-mestra da cultura – é o
grande diferencial das atividades do mundo moderno. Ela gera inovação, novos
formatos dos produtos, novas aplicações, novos públicos e novas linguagens. E
pelo seu caráter de transversalidade, exerce uma função integradora entre os
setores (público, privado, terceiro setor, instituições de ensino etc.) que
compõem o leque de construção do desenvolvimento de um país.” Dayse
Maria Oslegher Lemos
A CULTURA COMO PONTO DE PARTIDA
Hoje, o conceito evoluiu e vai
além da produção cultural e artística.
Na verdade, o próprio conceito de
cultura foi ofuscado, pois é geralmente reduzido apenas ao entretenimento e
belas artes, quando a cultura é a matriz, o DNA da sociedade.
Segundo uma das maiores
autoridades em Economia Criativa no Brasil, a futurista e fluxonomista Lala
Deheinzelin, “cultura é tudo aquilo que cria, e portanto transforma, mentalidades
(o jeito de pensar) e hábitos (o jeito de fazer)”.
A questão é que a Economia
Criativa não é apenas geração de valor cultural e artístico. Mas, de fato, o
seu ponto de partida é a cultura. Assim é possível dizer que a matéria-prima da
Economia Criativa são recursos intangíveis.
Se hoje vivemos uma realidade de
competição, baseada em recursos tangíveis como petróleo, terra e aço, e que se
tornam escassos com o consumo, ao contrário, os recursos intangíveis como
conhecimento, cultura e experiência são infinitos e se multiplicam com o uso,
podendo gerar uma economia de abundância.
Dessa forma a Economia Criativa
pode ser entendida como a semente para ativar e criar valor a partir de
recursos intangíveis.
A NATUREZA DA ECONOMIA CRIATIVA
A Economia Criativa é
exponencial, uma vez que os recursos se multiplicam com o uso, e pode ser
potencializada a partir da sinergia com outras áreas. A cada etapa do processo
de criação mais valor é adicionado, já que mais patrimônios intangíveis são
ativados. Quanto mais “camadas” adicionadas, maior é o valor final.
Assim, a natureza da Economia
Criativa é a integração de diferentes áreas e pessoas, contribuindo com seu
valor intangível, para adicionar e gerar valor econômico, social, cultural e
ambiental.
Se a Economia Criativa é um
processo baseado na ação integrada, quanto mais diverso for o ecossistema em
que o processo está inserido, maior o seu potencial.
“A economia criativa consegue,
portanto, por meio da agregação de traços de outros conceitos, um toque próprio
e inovador. Da economia da experiência, reconhece o valor da originalidade, dos
processos colaborativos e da prevalência de aspectos intangíveis na geração de
valor, sobretudo na cultura. Da economia do conhecimento, toma a ênfase no
trinômio tecnologia, qualificação de trabalho e geração de direitos de
propriedade intelectual. E, da economia da cultura, propõe a valorização da
autenticidade e do intangível cultural único e inimitável.”
NOVA ERA
Hoje vivemos uma era
pós-industrial, a economia da experiência.
Já passamos pela sociedade
agrícola, sociedade industrial, era da informação e hoje chegamos à era da
emoção, da colaboração.
Mesmo com base na Economia
Colaborativa, não basta somente entregar produtos e serviços eficientes e de
qualidade, é preciso proporcionar experiências, gerar emoção.
“Nossos desejos pessoais estão
mudando, assim como nosso sentimento de realização, de colaboração e a forma
como nos relacionamos. Como resultado dessa transformação, a economia também
está mudando. Seu foco passa de produtos para serviços, de commodities para
experiências e de preços fixos para descontos e, até, para o gratuito”. John
Howkins
Se antes o intangível era
importante, no futuro vai ser mais ainda.
E este é mais um desafio e também
uma oportunidade da Economia Criativa. Gerar experiências a partir do
intangível. Atividades que geram emoção, que envolvam o usuário, que se baseiam
na experiência para gerar valor.
A diferença está na experiência.
E ir além da experiência, contar
histórias, tornar visível, criar narrativas.
CARÁTER ESTRATÉGICO E OPORTUNIDADES
A Economia Criativa é muito ampla
e permite identificar nichos e criar demandas, principalmente em um momento de
transição.
É a base para o desenvolvimento
de iniciativas de diversas natureza.
Sob a ótica do empreendedorismo,
a Economia Criativa apresenta grandes oportunidades. Baixas barreiras de entrada,
novos mercados, novas demandas, e pouca exigência de capital financeiro, mas
muito em capital intelectual.
A tecnologia também é um fator
que favorece quem deseja empreender pois dá acesso à informação, amplia os
mercados e conecta os negócios com os usuários.
Olhando para o futuro, a Economia
Criativa é estratégica pois pode ser uma alternativa a uma crise mundial de
paradigmas, crise financeira e de sustentabilidade, que exigem novos modelos de
desenvolvimento que considerem nossa interdependência.
Além disso, ela se baseia em
recursos infinitos e que são abundantes mesmo em países subdesenvolvidos e
emergentes, e em atividades que tem simultaneamente impactos simbólicos,
financeiros, sociais e ambientais.
A Economia Criativa também é
importante para a economia de um país pois é um setor com enorme potencial de
crescimento e que pode se tornar um diferencial competitivo. Pode ser também a
base de uma economia saudável, sendo fator estratégico para pequenas e médias
empresas, e também gerando valor e riqueza para as classes mais pobres.
Para o desenvolvimento local, a
Economia Criativa é estratégica pois é um fator chave nos processos de
revitalização e qualificação de espaços urbanos e rurais, além de reduzir
índices de violência e proporcionar desenvolvimento a partir de experiências
com o turismo e entretenimento.
Do ponto de vista social e
educativo, a Economia Criativa é importante pois qualifica o capital humano e
promove o capital social, já que eleva a autoestima e confiança, possibilitando
o desenvolvimento de competências essenciais como a cooperação,criatividade,
inovação e adaptabilidade.
A Economia Criativa também é
estratégica do ponto de vista do trabalho, pois gera emprego e renda através de
uma nova forma de trabalhar, e mais do que isso, impacta profissionalmente
outras atividades econômicas, promovendo a evolução através de negócios mais
criativos, inovadores e que se apoiam em bases culturais.
“Além dos benefícios econômicos,
a economia criativa também contribui significativamente para o desenvolvimento
social. Seu potencial para gerar bem-estar, autoestima e qualidade de vida em
indivíduos e comunidades, por meio de atividades prazerosas e representativas
das características de cada localidade, estimula o crescimento inclusivo e
sustentável”. Relatório de Economia Criativa 2013
Portanto, o novo paradigma da Economia Criativa se refere a gerar bem comum, gerar trabalho e renda, inclusão social e produtiva, potencializar terceiro setor e economia solidária, diversidade cultural, uso de novas tecnologias, novos modelos de gestão, novas linguagens, e principalmente desenvolvimento sustentável da sociedade.
A CHAVE PARA O FUTURO
Muito mais que criatividade e
economia, a Economia Criativa é sobre utilizar recursos que todos nós
possuímos, inteligência, cultura, criatividade, colaboração para gerar valor,
riqueza e experiências únicas.
E este é o grande segredo, o
grande desafio.
Usar o potencial de criação
humano para conectar experiências únicas a um nicho que a demande e gerar valor
nas dimensões cultural, ambiental, social e financeira.
Difícil mas não impossível.
Descobrir qual seu talento único,
dar visibilidade, criar um ecossistema, identificar seu nicho, contar
histórias, criar experiências e entregar valor são os passos para utilizar a Economia
Criativa a seu favor.
Confiar, cuidar e cocriar são o
caminho.
A Economia Criativa é uma das
chaves do futuro e da sustentabilidade.
É a pedra fundamental de criar os
futuros desejáveis.